Meus
amigos, escrever essa coluna não é fácil, pois a cada semana devo
abordar um tema referente ao nosso esporte e após cento e nove
colunas a coisa fica bem difícil. Para me inspirar, procuro em minha
memória temas vividos e que trariam lembranças aos dias atuais. E
faço isso enquanto caminho pelo calçadão da Avenida Atlântica,
aqui em Balneário Camboriú. Geralmente, são oito quilômetros
entre a ida e a volta, que permitem que meu pensamento dê algumas
voadas pelo tempo e pelo espaço.
Hoje, ao
iniciar a minha jornada, procurei dar tratos à bola e fiz uma
pergunta dificílima. Quem foi o inventor do futebol de mesa?
Confesso
que já havia tentado decifrar esse enigma monstruoso, mas nunca me
ative a detalhes sobre a sua criação e evolução. Ao voltar ao meu
lar, abri meus arquivos e me pus a conferir todo o material que havia
coletado.
Procurei
um texto de autoria do botonista Enio Seibert, criador da Regra
Unificada, onde apresenta uma foto feita em Londres, em 1910,
remetida pelo sérvio Milos Krstic, na qual dois senhores aparecem
diante de uma mesa, pela qual se pode observar dois times preparados
para jogar. O impresso “LEADER” nos fornece a impressão de que
os ingleses inventaram o futebol de campo e, possivelmente, a
variante denominada futebol de mesa.
No mesmo
texto há uma tese de Marcelo Coutinho, do Rio de Janeiro, cuja linha
de raciocínio nos expõe:
- Numa
época da humanidade em que não havia automóveis e aviões, onde as
comunicações mundiais eram escassas, marinheiros teriam trazido da
Europa, simultaneamente com o futebol de campo, entre 1900/1910, uma
concepção rudimentar do jogo de futebol de botão, introduzindo-o
nas cidades portuárias da costa brasileira.
Como os
botões eram baratos e relativamente fáceis de conseguir, a adesão
foi imediata e a garotada passou a divertir-se, praticando um futebol
mais acessível do que o caríssimo futebol, cujas bolas, chuteiras,
camisetas deveriam ser importadas, pois nada necessário à prática
do futebol era fabricado em nossa terra. Marcelo acredita que os
jogos teriam começado a ser disputados nas primeiras décadas do
século passado, mais ou menos ao mesmo tempo, em vários lugares, o
que leva a crer em uma geração espontânea, pois a idéia em si não
é muito difícil de ser imaginada.
Em seu
texto, o exímio botonista Enio continua divagando, afirmando que as
primeiras partidas de futebol de botão foram jogadas sobre as
calçadas, pisos de granítica, cerâmica ou mármore e assoalhados
de madeiras das casas e, mais tarde, para as mesas de jantar das
residências. Nelas, poderiam ser jogadas partidas, estando os
botonistas em pé e não mais rastejando, agachados no chão,
esfolando os joelhos e pernas, forçando a coluna vertebral, causando
com isso dores nas costas.
Em muitos
relatos escritos sobre o futebol de mesa, é afirmado que seu
inventor foi Geraldo Décourt, como publicado na obra: Futebol de
Botão, uma paixão nacional, de Marcelo Minuzzi.
Como tive
a felicidade de privar da amizade de Décourt e com ele conviver
durante algum tempo, muitas vezes abordamos esse assunto e,
constrangido, afirmava que jamais gostaria de ser rotulado como o
inventor desse esporte, uma vez que, aos dez anos de idade, conhecera
os irmãos Higino e Francisco Magini, que o ensinaram o futebol de
botões, tendo jogado pela primeira vez na escadaria da Rua Visconde
de Paranaguá, onde morava no número 40. Depois, conseguiu sua
primeira mesa envernizada e, em sua residência, organizaram
campeonatos com Mario Salorenzo, José da Silva, Rudolf Langer, Oscar
Vieira e Jaime Ferraz. Sua contribuição valiosa foi a confecção,
em livreto, da Regra de Foot-ball Celotex, em 1930, regra essa
vendida em banca de jornal e revistas. Cita ainda que, na época do
celotex, Carlos Hélio Portugal da Cunha o impediu de ser tri-campeão
carioca, vencendo-o por 3 x 1, jogando com perfeição e lealdade.
Foi nessa
mesma época que o carioca Getúlio Reis e Faria adquiriu um exemplar
da regra e passou a utilizá-la em sua associação (Liga Carioca de
Futebol de Botões), onde vários rapazes disputavam ferrenhos
campeonatos. Um desses rapazes era o conhecidíssimo Costinha, exímio
botonista. Getúlio sempre alimentou o desejo imenso de conhecer
Décourt, coisa que aconteceu somente cinquenta anos depois de haver
adquirido o exemplar da regra publicada, em um encontro no Rio de
Janeiro, onde os dois botonistas defrontaram-se na Regra Brasileira,
pois Getúlio foi um dos primeiros a aderir a ela. Para Décourt ter
condições de disputar essa partida, enviei-lhe uma seleção
italiana, com botões azuis, chuteira branca e com o distintivo
italiano.
Defendendo
a tese da geração espontânea que Marcelo apresentou, vamos
observar que em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, no ano de 1941,
Lenine Macedo de Souza cria a Sociedade General Lima e Silva, com uma
dezena de rapazes.
No Rio de
Janeiro, o jornalista Fred Mello, em 1945, cria a regra que ficou
conhecida como leva-leva (toque-toque com número ilimitado de
toques), ainda hoje praticada em jogos não oficiais.
Em 1961,
o mesmo Lenine Macedo e Souza, criador da Regra Gaúcha, funda a
primeira organização reconhecidamente voltada ao futebol de mesa,
denominada Federação Riograndense de Futebol de Mesa. Num esforço
incomum, Lenine ajuda a criação da Federação Paulista e a
Federação Mineira no ano seguinte, tentando introduzir a Regra
Gaúcha, sem obter sucesso.
Nessa foto estão Lenine Macedo de Souza, um menino e Clair
Marques.
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Se, em
1961, é criada a Federação Riograndense, em 1962 é criada a Liga
Baiana de Futebol de Mesa, que reuniu os diversos clubes de bairros
de Salvador em uma associação que regulava as competições. Isso
nos leva a crer que o futebol de mesa baiano era disputado há algum
tempo. Em 1962, as mesas eram idênticas às atuais da Regra
Brasileira. Pouco tempo depois, começou a disputa dos torneios
denominados Nordestões, que reuniam diversas entidades estaduais em
um local, tendo o primeiro sido vencido pelo baiano Webber Seixas, de
saudosa memória.
Se
realmente o futebol de mesa veio até nós, através de marinheiros,
podemos afirmar, sem dúvida alguma, que nosso esporte é centenário,
pois a primeira publicação que conhecemos data de 1910, através do
impresso “LEADER”, convocando os britânicos para um campeonato.
Sabemos que o futebol de mesa está forte e vibrante na Europa, Ásia
e América, mas desconhecemos a sua origem, o seu nascimento, a
primeira pessoa que teve a brilhante idéia de imaginar o futebol
sendo jogado com botões. Se essa pessoa imaginasse a grandiosidade
que essa invenção ganharia no decorrer do tempo, com certeza teria
patenteado a invenção, fazendo com que seus descendentes se
tornassem milionários.
Por essa
razão, defendo a variedade de maneiras de praticá-lo, pois é um
esporte que, apesar de ser conhecido internacionalmente, é cometido
regionalmente de formas diversas. Se enumerássemos todas as regras
aplicadas somente em nosso país, com certeza ficaríamos abismados
com o seu número. Por isso, eu acredito que a alegria que temos
exercitando o “nosso futebol de mesa” não deve ser contestada
por ninguém, pois cada um é feliz a sua maneira.
Nessa foto estão Geraldo Cardoso Décourt, Antonio Maria Della
Torre (presidente da Federação Paulista de Futebol de Mesa) e eu.
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E é
feliz quem joga botão, pratica futebol de mesa, vibra e sofre com
suas vitórias e derrotas e, sobretudo, faz amigos que se tornam
irmãos. Que o futebol de mesa continue para todo o sempre, e que um
dia possamos descobrir quem foi o grande benfeitor que o inventou,
pois hoje é uma pergunta sem resposta.
Até a
semana que vem, se Deus assim permitir.
Meu caro Sambaquy. Minha experiência com o futebol de botão surgiu logo após a 2ª Guerra Mundial, em 1946, quando vi dois amigos mais velhos (Aloísio Portela e Tota Virães) jogando num pequeno campo sobre uma mesa. Os botões eram de capa e tinham nomes em suas superfícies esritos a tinta. Um nome ficou até hoje gravado na mente: Sidinho - back direito do Santa Cruz (time de Tota). O time de Aló era o Náutico. A regra era leva-leva, o goleiro de caixa de fósforos e a bola era um botão esférico de madrepérola, chamado de conta de colar de mulher. Na época, também, apareceram os botões de chifre e um outro amigo (de nome Ivan) - cabo do Exército jogava com o irmão Iran, num campinho de celotex (quadro de avisos utilizados nas escolas). Os botões eram pequenos, mas tinha um que se destacava dos demais e tinha um nome inusitado: Espalha brasa.
ResponderExcluirResumindo sobre o tema: Aqui em Pernambuco, o botão surgiu no final dos anos 30 e teve sequência nos anos pós-guerra. Uma coisa é certa: as bolas eram esféricas (vassourinha de botão, contas de colar feminino, cortiça). O nome celotex, creio, se deve ao campo de jogo (quadro de avisos utilizados nas escolas). Portanto, meu caro Sambaquy, vai ser dificil descobrir a origem. Mas vale o esforço e a dedicação. Viva o botão!
Meu amigo Abiud,
ExcluirSomos contemporâneos no tocante ao conhecimento do futebol de mesa, pois eu o conheci em 1947. De lá até agora muita água rolou por debaixo da ponte. Quanto a bolinha esférica tipo contas de colar feminino, eu possuo uma, que ganhei de Décourt, utilizada por ele na época do celotex.
O tempo em si é empolgante e dará muito pano para manga, pois acredito que jamais saberemos quem inventou, mas continuaremos para sempre jogando e gostando cada vez mais de nosso esporte.
Viva o botão e receba o meu abraço.