domingo, 3 de fevereiro de 2013

AS PRIMEIRAS BOLINHAS USADAS NA REGRA BRASILEIRA.


Ao final da criação da Regra Brasileira, em janeiro de 1967, a bolinha determinada para a prática do futebol de mesa seria um botão denominado “olho de peixe”, que por sinal já era utilizado em todo nordeste brasileiro.
Ao retornarmos ao Rio Grande, trazendo os exemplares da Regra, trouxemos também algumas bolinhas “olho de peixe”, julgando que teríamos facilidade em encontrar nas diversas lojas comerciais de nossa cidade. A verdade é que esse tipo de botão estava sendo abandonado pelos fabricantes, uma vez que as cuecas estavam sendo modificadas e, ao invés de serem abotoadas, usavam elástico na cintura. Com isso, tornaram-se raros os botões que conseguíamos comprar. Alguns ainda recorriam a botões em uso e os trocavam por outro tipo, juntando tudo o que conseguiam para que pudéssemos realizar nossos jogos.
Os poucos botões “olho de peixe” eram cuidadosamente manipulados, pois se tornavam raros. E a dificuldade não era só nossa. Os nordestinos começaram a reclamar da falta da mercadoria nas diversas lojas de suas cidades.
Foi então que fomos surpreendidos pelo nosso querido amigo Raymundo Antonio Rotta Vasques. Como jogávamos aos sábados, cada um de nós que possuía carro passava na casa dos demais para levá-los até as dependências da AABB. Eu sempre chegava cedo e começava a preparar as mesas. Logo em seguida, chegava o Calegari, trazendo o Vasques, seu filho Raymundinho e mais alguns botonistas que encontrava pelo caminho. Vasques colocava uma caixa na mesa e perguntava para todos o que ela continha. Palpites de que continha botões para jogar, papéis para limpar as mesas, etc. Pelo tamanho da caixa deveria ser coisa de tamanho médio.
Para nossa surpresa, Vasques abre a caixa e ela está repleta de “olhos de boi”. Milhares de bolinhas estavam ali, diante de nós, prontas para servirem em nossos jogos. Foi então que a curiosidade se estabeleceu entre todos. Afinal, cada um de nós havia percorrido quase todas as lojas da cidade à procura daquele material e ele aparecia ali com uma quantidade que poderia ser utilizada por algum fabricante de cuecas “samba- canção”.
Vasques, com a sua veia poética, narrou a epopeia dessa conquista. Tendo a manhã livre, dirigiu-se à Loja Pratavieira, portando um botão “olho de boi” na mão perguntou à balconista se ela conseguiria aquele tipo de botão para ele. Ao olhar o botão, a menina apanhou uma caixa e disse que tinha em boa quantidade. Rapidamente, Vasques ordenou que ela embrulhasse a caixa, pois ele levaria tudo. A moça ficou intrigada e perguntou curiosa o que ele faria com tantos botões.
Vasques -  dono de um raciocínio rapidíssimo, olhou para a menina e disse, sério como sempre foi: A minha esposa está fazendo uma bandeira do Brasil e vai bordá-la com esses botões. Vão colorir alguns de verde, outros de amarelo e de azul. Os brancos ficarão como estão. Assim a escola dela apresentará uma bandeira diferente no desfile de Sete de Setembro, pois essa bandeira não tremulará, ficará fixa. Será uma novidade. Você vai ter a oportunidade de ver isso com os seus olhos, quando a escola dela passar.
A menina, convencida da veracidade e da importância do assunto, embrulhou e entregou ao Vasques o tesouro de que todos nós desfrutaríamos.
Para nós, o problema estava resolvido. Cada um ficou com um punhado de botões para os seus treinos, e o restante ficou depositado na AABB.
Mas, para o restante do país, o problema estava ficando cada vez mais grave. Não existiam mais “olhos de peixe” no mercado. E o campeonato brasileiro de 1970 já estava alinhavado pelos baianos. Foi necessária a criação de uma bolinha (disquinho) que se assemelhasse ao “olho de boi”. Um botonista sergipano conseguiu criar esse tipo de bolinha e foi prontamente adotada por todos os praticantes da Regra Brasileira. Recebemos o material oriundo da Bahia, para onde havíamos enviado uma boa quantidade de botõezinhos que, entretanto, ficaram sem uso, pois a adoção do disquinho foi obrigatória a todos nós.
A bolinha utilizada na Regra Gaúcha era côncava e, dependendo do lado que parasse na mesa, não levantava do chão, sendo então impossível fazer gol sobre o arqueiro. Esse nosso disquinho era próprio para ser erguido e cobrir o goleiro, sempre que fosse chutada por um botão atacante.
Para matar a saudade, estou postando o restante que ficou em meu poder de “olhos de boi”, pois  servirá algum dia para ilustrar um museu do futebol de mesa. Afinal, foi com ela que iniciamos a nossa caminhada pelas mesas do Brasil. Na foto, estão os “olhos de boi”, as bolinhas utilizadas na regra gaúcha e os disquinhos, alguns em cores adotadas pela Confederação para os diversos campeonatos realizados.

Recordando a façanha do querido amigo Vasques, companheiro inseparável do Calegari, bate uma saudade de um tempo maravilhoso em que solidificamos amizades, através do futebol de mesa. Saudade de amigos e façanhas incríveis.

Até a semana que vem, se Deus assim permitir.
Sambaquy

4 comentários:

  1. Meus amigos,
    Para elucidar dúvidas, uma vez que a bolinha era conhecida como "olho de peixe", nós gaúchos, usávamos uma maneira diferente para a mesma, chamando-a de "olho de boi", com referência ao selo rarissimo sempre procurado pelos colecionadores.
    Foi citada várias vezes, para que não esqueçamos nunca do esforço em consegui-las.

    ResponderExcluir
  2. LH.ROZA...
    Meu "amigo" que bela resenha, cada leitura de sua "Coluna" é como reviver os bons tempos.
    Como me arrependo de não ter guardado pelo menos um botão, de tantos plantéis que passaram pelas mais diversas caixinhas.
    Assim como tantos "olho de boi" e/ou os grãos de milho, lixados,em compensação guardo alguns "DISCOS" junto de alguns Troféus mais recentes. .
    Meu encantamento pelo hoje "FUTMESA" foi aos 8 anos (1953), mas a 1ª Medalha veio em 1959, ao longo dos tempos tivemos muitas emoções e/ou decepções, conquistamos verdadeiros AMIGOS conservados até hoje.
    + 1 vez deixamos 1 forte abraço

    ResponderExcluir
  3. Meu caro Sambaquy. Que beleza! Mas esse "olho de peixe" foi o que me fez ficar sempre com a regra leva-leva que depois deu origem à regra pernambucana, atual botãobol. Para nós que iniciamos o jogo de botão nos fins dos anos 40, era um sacrilégio jogar com uma bolinha que não fosse esférica. Mas valeu! Um abração. Viva o botão!

    ResponderExcluir
  4. Maravilha de recordação e ainda detalhada assim..obrigada Sambaquy!

    ResponderExcluir