Já falei muito do amigo Décourt.
Todos sabem que ele nasceu em Campinas (SP) em 14 de fevereiro de 1911 e que
escreveu o primeiro exemplar de regras de futebol de mesa, (em 1930), denominado
de foot-ball celotex. O que talvez tenha passado despercebido é que ele morou
em Porto Alegre por cinco anos e ali, em 1946, promoveu um campeonato de
futebol de botões, com a cobertura da Folha da Tarde, onde mais ou menos
quatrocentos botonistas se inscreveram. Deu a esse campeonato o nome de seu
mestre Higino Mangini, que lhe ministrou as primeiras lições desse esporte no
ano de 1922.
Décourt era um artista natural.
Compunha e cantava músicas, era modelo fotográfico, artista do cinema nacional,
tecelão e pintor de quadros.
Certa ocasião, encontrando-se com
Manézinho Araújo, ex- cantor de emboladas e ex- proprietário do Restaurante
Cabeça Chata no Rio de Janeiro e em São Paulo, logo após o Programa Cesar
Ladeira, na Rádio Mayrink Veiga, lá pelo ano de 1935, foram para o Bar da
Brahma, no Largo da Carioca.
E a conversa entre os dois, um
cantor e compositor de emboladas e o outro cantor e compositor de sambas, foi
sobre o futebol de mesa. Manézinho pergunta à Decourt: Você era aquele Geraldo
Décourt do Futebol Celotex, que tinha um retrato seu na sede da Liga
Pernambucana? Nele estavas recebendo um
troféu. Você conheceu o Jota Soares, cineasta de Recife, presidente da Liga?
A resposta de Décourt: - Sim, Manézinho.
Não era eu. Sou eu mesmo!
Esse grande botonista, que
iniciou suas atividades muito tempo antes de nós pensarmos em nascer, trabalhou
o nosso esporte em épocas onde a comunicação era difícil, onde predominava como
comunicação o rádio e o jornal. E mesmo assim, jamais desistiu de mostrar o
futebol de mesa aos amigos e divulgá-los em todos os cantos do país.
O conheci nos anos 80. Ele já com
seus setenta e poucos anos e eu na faixa dos quarenta. Era uma pessoa
cativante, expansiva, agregadora e entusiasta. Já nessa época sofria do Mal de
Parkinson. Suas mãos tremiam muito, mas mesmo assim jogava com prazer seu
futebol de mesa. Seus botões, em virtude desse problema eram feitos em camadas,
para que pudesse descansar a paleta e ir baixando com vagar, até impulsioná-los
de encontro à bolinha esférica.
Aprendi muito em conversas com
ele. Era um manancial de recordações que nos fazia transportar mentalmente aos
primórdios do futebol de mesa nacional. E sua fala mansa era envolvente e
compreensiva. Foram muitas as visitas à sua residência. Tínhamos muita coisa em
comum, o mesmo gosto pelo esporte, gosto pelas artes e éramos irmãos de fé.
Mantivemos correspondência por
muitos anos. E sempre havia alguma novidade nelas. Uma das últimas foi o
convite que fez para mim, a fim de completar a equipe paulista que iria
participar de um torneio em Curitiba, no Circulo Militar. Honrado, me fiz presente e ao final do Torneio o
trouxe até Brusque. Permaneceu alguns dias na cidade dos tecidos, quando a
Associação Brusquense de Futebol de Mesa lhe homenageou com um churrasco, em
sua sede social, e ofertou-lhe um magnífico cartão de prata por sua grande
participação no esporte que praticávamos.
Uma das últimas cartas recebidas,
quando seu estado de saúde já não permitia a sua locomoção, enviou-me a foto
que ilustra essa coluna, com o seguinte comentário: Amigo Samba (8/11/88). Estou na foto com meu genro Lúcio Alberto que
estava em Londres. Aviso que do cavanhaque passei para a barba. Outra vez
mandarei foto mais recente, este é de 12/87. Não estou tão gordo assim, pois na
foto estou muito perto (1º plano).
Estou agora com 82 quilos... e na foto sem cinta.
Abraços,
Do Décourt, “apenas”
Sempre foi cuidadoso com a sua
imagem, pois ela servia muito ao trabalho que desenvolvia como modelo
fotográfico.
Infelizmente não teve a chance de
enviar novas fotos.
Até a semana que vem, se Deus
assim permitir.
Sambaquy. Infelizmente, não tive essa honra de conhecer essa figura ímpar do futebol de botão. No texto, vê-se que ele faz referência a Manezinho Araújo e a Jota Soares. Conhecia o Jota através dos seus longos comentários de futebol, principalmente quando era sobre seu time de coração, o Náutico. Sabia que era também jogador de botão, junto com outros radialistas da época. Nunca tive grandes relacionamentos e minha vida se limitava ao bairro onde morava e algumas poucas incursões em outros locais do Recife, porém, sem dar continuidade. Em suma, ficamos isolados,como até hoje ocorre. Mas a vida segue seu curso e é ótimo e reconfortante ficar conhecendo essas histórias. Um abração pernambucano. Abiud
ResponderExcluirAbiud,
ExcluirEu considero a minha maior conquista no futebol de mesa ter privado da amizade dessa pérsonalidade que tanto fez pelo nosso esporte. Foram inúmeras as vezes em que estive em São Paulo e pude visitá-lo. noutras tantas vezes, junto com ele e Della Torre visitamos os clubes que praticavam o futebol de mesa. Tive a oportunidade de conhecer duas lendas do futebol: Oberdan Cattani e Gino, o artilheiro do São Paulo, tudo através dessa amizade.
Pernambuco sempre foi um celeiro de grandes botonistas. Acompanho desde a época de Ivan Lima.
Abração gaúcho/catarinense. Sambaquy