Hoje, a
nostalgia voltou e me lembrei de um antigo companheiro de luta que
pontificou no nosso esporte na cidade de Brusque.
Trata-se
de Walmir Merísio. Em sua juventude, craque de futebol do Carlos
Renaux e do Paysandú, clubes que defendeu com muito brio e
virilidade. Merísio era um zagueiro que chegava junto e na maior
parte das vezes “levantava” seu adversário. Por isso, muitas
vezes foi expulso de campo.
Na Foto da esquerda para direita: Adauto Sambaquy, Walmir Merísio (de amarelo),
José Ari Merico e Oscar Bernardi (então vice presidente da Associação Brasileira e
presidente da Associação Brusquense)
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Ao se
aposentar do futebol, passou a trabalhar com seu sogro em uma
Marcenaria. As famílias tradicionais de Brusque construíam suas
casas em terrenos próximos, e a família Merísio se situava nas
terras dos Walendowsky. Seu sogro e o irmão dele tinham terras na
Avenida Primeiro de Maio ,onde estava localizada a empresa Walendoswy
e a Marcenaria do seu Alois, do sogro do Merísio.
Cidade
pequena, grande parte dos seus moradores tem laços de parentesco.
Quando
recebemos a primeira mesa oficial, enviada pelo Marcos Zeni, houve um
envolvimento de muitas pessoas na cidade. Estavam interessados em
saber como era o futebol de mesa organizado, com Associações,
Federações e Campeonatos Nacionais. Por isso, ao ter de receber a
mesa, solicitei ao Roberto Zen (São Paulo F. C.) que arrumasse
pessoas para levá-la à sede da AABB. Roberto chamou seu irmão
Valter e o cunhado Sérgio Walendowsky, e os três carregaram a dita
por três lances de escada até sua colocação final no recinto
social da Associação Atlética Banco do Brasil no centro da cidade
de Brusque. O Roberto já havia adquirido um time do São Paulo,
fabricado pelo José Castro Sturaro da Bahia. Eu havia recebido
alguns times para a comercialização e os dois se interessaram
imediatamente. O Sérgio comprou um Vasco da Gama e o Valter, um
Fluminense.
O Sérgio,
diretor da empresa Walendowsky mandou confeccionar uma mesa para seu
uso particular. Foi então que ele chamou o Merísio para verificar a
mesa oficial e fabricar uma idêntica.
Comprada
a madeira, começa a tarefa de produção da citada mesa. O Merísio,
um cara de bem com a vida, que gozava com a cara de todos os seus
amigos, a cada visita do Sérgio ou do Valter na Marcenaria, ria e
dizia: Dois barbados jogando botãozinho... Não acredito, ainda
quero ver isso acontecer.
Só que
ele ainda não tinha visto os times de botão. Não tinha
conhecimento de como era praticado o futebol de mesa. Os dois já
estavam praticando o futebol de mesa nas dependências da AABB e, por
isso, já se tornava habitual o manejo dos botões.
A mesa
fica pronta e é levada para a casa do Sérgio. Noite festiva, pois
era aguardado com ansiedade esse momento histórico. Os cavaletes
ajustados, a mesa colocada sobre eles e os dois cunhados, pois o
Valter era casado com a irmã do Sérgio, colocam seus times na mesa.
Nesse
momento, os olhos do Merísio brilham de forma diferente. Ele esquece
todas as gozações que havia feito com os dois primos, pois era
casado com uma prima do Sérgio e diz textualmente e alto e bom som:
Eu fiz a mesa e por isso serei o primeiro a jogar nela.
Ninguém conseguiu dissuadi-lo disso. Pegou o time do Valter e jogou
uma partida contra o Sérgio. Ao final dela, apanhou o time do Sérgio
e enfrentou o Valter. Mudavam os adversários, pois o Merísio
continuava na mesa. Foi amor à primeira vista.
No dia
seguinte, ele foi me procurar. Queria um time de qualquer maneira.
Entre os que eu tinha para colocação, havia um Juventus, da Mooca,
grená. Foi nesse que ele se encantou. Batizou-o como, o Juventus, da
cidade de Rio do Sul, um time que era simpático a todos os
catarinenses.
Ninguém
mais segurou o homem. Jogava e treinava sempre. Bem diferente do seu
tempo de futebolista, quando não gostava de treinar. Quando
caprichava era difícil dobrá-lo, pois era incisivo no ataque e
seguro na defesa. Foi o primeiro a me derrotar em terras
catarinenses.
Ao todo,
jogamos 23 vezes, com nove vitórias conseguidas contra ele, seis
derrotas e oito empates.
Quando
ele jogava a sério, era muito difícil vencê-lo. Foi campeão no
segundo campeonato brusquense, quando ainda jogava com a Juventus.
Depois disso, mandou confeccionar um Corinthians, com o qual
conseguiu feitos memoráveis, como ser campeão do Torneio dos
Campeões Brusquenses.
Seu
espírito brincalhão, muitas vezes, fazia com que se desse mal. Em
1977, ao ter de enfrentar o “Calito” Moritz (Flamengo), que
iniciava na prática do futebol de mesa, resolveu brincar e relaxou.
Só que o Calito foi amontoando gols, enquanto o Merísio brincava.
Quando se deu conta, estava com quatro goles negativos e não deu
tempo para mudar a história. Custou cara a brincadeira, pois com
essa derrota ficou fora das finais. Depois disso, procurava sempre
levar a sério os jogos, sempre afirmando que estava vingando-se
daquela derrota vexatória, a qual nos serviu de vingança por todas
as suas brincadeiras.
Tornou-se
o amigo número um dos caxienses: Airton Dalla Rosa, Luiz Ernesto
Pizzamiglio e Nelson Prezzi. Era uma festa quando os encontrava; e o
Pizza, também, eterno brincalhão, apelidou-o de “Velho”, coisa
que pegou dali por diante. Para nós, o “Velho” era o exemplo da
dedicação e o fabricante das mesas que serviram de palco para o
primeiro Centro Sul, na época Sul Brasileiro, realizado em 1979 e o
sétimo Brasileiro em 1981. Suas mesas eram elogiadas por todos e ele
as fazia sempre na cor verde, pois a primeira recebida era assim.
Sempre
que estava necessitado de dinheiro, telefonava para mim perguntando
se eu precisava de alguma coisa da marcenaria. Então eu pedia alguma
coisa, pois sabia que ele faria com presteza. Tenho até hoje uma
estante com gavetas, onde guardo os times de botão das diversas
regras. Em outras ocasiões, dizia-lhe que necessitava de um balcão
para a pia na minha adega; ele ia até a minha casa, media o espaço
e, no dia seguinte, estava o mesmo colocado. Dois a três dias depois
não conseguia abrir a porta da estante e, se a abria, não conseguia
fechá-la. Ele ia lá e arrumava e me cobrava o trabalho. Mas, eram
sempre valores pequenos, pois o resultado era para uma festinha
programada, coisa frequente naquele tempo.
Foi um
colaborador excelente no primeiro centro sul e no sétimo brasileiro.
Fazia questão de brincar com todos os que nos visitavam e foi, por
eles todos, admirado. Sempre que me encontrava, fazia a tradicional
pergunta: “Os veadinhos de Caxias não vêm jogar com a gente?
Quero vencer aqueles dois bichinhas.”
Através
do futebol de mesa, resgatou todos os prêmios que havia ganhado nos
diversos campeonatos de futebol que disputara e um dia me convidou
para ir até a sua casa. Fui lá e ele, orgulhoso, mostrou-me uma
estante envidraçada que havia construído, contendo os troféus do
futebol de mesa e os prêmios que arrebatou no futebol. Havia faixas
de campeão catarinense, campeão brusquense, da Liga Blumenauense,
misturadas aos diversos prêmios angariados com seu desempenho no
futebol de botão.
Depois de
sofrer um enfarte, diminuiu sua atividade. Mas estava sempre junto
conosco. Era uma figura que se sobressaía em qualquer ocasião.
Quando estávamos promovendo o Campeonato Brasileiro, fomos
convidados a ir até Florianópolis participar do programa do Roberto
Alves, falando sobre a grande iniciativa da Associação Brusquense,
inédita em Santa Catarina. Ao entrarmos no estúdio, o Roberto
Alves, ao ver o Merísio, enalteceu o craque futebolista e com isso a
promoção ganhou um destaque especial. Nessa ocasião, presenteamos
o comentarista com um time do Fluminense.
Em
janeiro de 1995, o grande Merísio sofreu mais um enfarte e não
resistiu. Nessa mesma ocasião, após uma cirurgia, eu sofri várias
hemorragias e estive com um pé no lado de lá. O pessoal da
Associação, em tom de brincadeira, afirmou que Deus, olhando para
os dois que iriam ter de subir, disse: Os dois aqui não. Só um. Que
venha o Merísio.
Hoje, com
muita saudade, recordo os momentos que passamos juntos, praticando o
esporte que tanta alegria nos concedeu.
Até a
semana que vem se Deus assim permitir.
Sambaquy
É isso aí, meu caro Sambaquy. Ainda bem que temos o dom de lembrarmos dos bons momentos que a vida nos proporcionou. Valeu a lembrança!
ResponderExcluirDe minha parte, Deus quis que eu continuasse mais um pouco, mas muitos dos queridos botonistas já estão em outro plano. Um dia estaremos todos juntos e então o jogo de botão será eterno, para sempre. Abração pernambucano.
Meu amigo Abiud,
ResponderExcluirPara nós, os idosos do futebol de mesa, essas são coisas que acontecem a todo instante: lembranças de amigos que se foram e o aparecimento de novos amigos a todo instante.
Realmente não há substituição em nosso coração, mas, sempre um lugar para mais um ocupar.
Enquanto pudermos sonhar, perseguir esses nossos sonhos, com certeza estaremos sempre em atividade. Ainda quero ter a alegria de poder abraçá-lo e aos demais dessa linda Recife. Receba o meu abração gaúcho/catarinense.