segunda-feira, 13 de junho de 2011

SÉRGIO CALEGARI – UM BOTONISTA DE ESCOL.



Quando iniciamos a nossa carreira no Banco do Brasil encontramos um antigo funcionário que estava sempre alheio a tudo o que se passava ao seu redor. Seu trabalho era arquivar documentos, pois naquela época nem imaginávamos o uso do computador para a realização de todas as operações.

Por essa razão era uma pessoa que pouco participava, que nunca se envolvia em movimento algum. Fora do ambiente do Banco não sabíamos onde encontrá-lo, pois era um desconhecido.

Com o advento do futebol de mesa, Calegari foi sendo informado através da revistinha da AABB, que sempre trazia reportagens com os resultados dos jogos, com as próximas rodadas, com a adesão de novos companheiros. Foi então que ele descobriu o caminho que o levava à AABB. Chegou-se, meio tímido e foi bem recebido. Tinha um time do América, do Rio de Janeiro. Começamos a jogar e ele logo foi tomando gosto, pois havia jogado botão em sua juventude. Ele era bem mais velho do que todos nós, que beirávamos os vinte e cinco anos. O Calegari já chegara aos 33 anos.

Quando mudamos para a Regra Brasileira, comprou da mão dos baianos um time do C. R. Flamengo e começou a fazer grandes jogos. Mas, ainda não estava satisfeito, pois o seu sonho era um time do Grêmio Porto Alegrense. Mandou fazer um especial, com a camisa tricolor e quando esse chegou, fez uma festa incrível.

Com o futebol de mesa o Calegari passou a ser figurinha carimbada na AABB. Passou a jogar futebol de salão e sua posição era goleiro. Aos poucos foi havendo uma enorme transformação em suas atitudes. Passou a ser mais requisitado e participar ativamente de todo movimento. Encarregou-se dos meninos, organizando campeonatos com os pequeninos filhos de associados da AABB. Foi um líder inconteste. Acabou sendo eleito presidente da Liga Caxiense de Futebol de Mesa e sua administração foi coroada de êxito. Foram inúmeros torneios realizados em sua gestão.

Quando, depois de uma rodada de final de semana, realizada no Clube Guarany, resolvemos visitar o Vicente Sacco Netto, em Canguçú, prontificou-se e foi graças a seu apoio que realizamos a empreitada, saindo de Caxias, pouco antes da meia noite e chegando àquela cidade às seis horas da manhã. Ele estava sempre pronto para colaborar.

A grande realização conseguida foi quando Oldemar Seixas convidou uma equipe caxiense para um torneio em Salvador, inaugurando sua Associação. Conseguimos convencer o Calegari a viajar conosco. Seria a sua primeira viagem para fora do Rio Grande do Sul. Compramos as passagens da Varig e nos colocamos na estrada. No aeroporto Salgado Filho começou o batismo de fogo do nosso amigo. Estávamos no bar fazendo um lanche, à espera de nosso vôo e com a mesa cheia de pratos e bebidas, o Calegari consegue derrubar uma garrafa de refrigerante e molhar tudo. O garçom, prontamente veio enxugar e olhando para o Calegari perguntou: o senhor só pode ser gremista... A risada correu solta até a hora do embarque.

Embarcados, o Calegari quis a janela. Sentou-se e como fazia quando estava em seu fusquinha, cuspiu. Só que a cuspida ficou estatelada no vidro da aeronave. Mais risadas e o Sá Mourão que fazia as graças com tudo, fez o maior escarcéu, perguntando para a comissária de bordo se não limpavam o avião, pois na janela do colega dele estava uma cuspida. O Calegari envergonhado passou o lenço, limpando seu cuspe. Outra maldade que fizemos com ele foi dizer que teria de pagar por tudo que consumisse na viagem. Todos nós pedíamos o que tínhamos direito e ele só queria água. Foi de Porto Alegre até Salvador tomando água.

Em Salvador, o programa de jogos seria à noite. Com o dia livre, vamos para a praia. Só que o Calegari não havia levado roupa de banho. Não tem problema, pois vamos te ajudar a escolher um short para entrares no mar. Só que fizemos comprar um short minúsculo. Ele bem gordinho ficava com banha sobrando para todos os lados. Era hilário.

Ele tinha falta de audição e usava um aparelho no ouvido. Ao sentar na areia, com todo o barulho do mar e a gritaria dos vendedores, resolveu tirar o aparelho do ouvido e começou a brincar com ele. Colocou na areia e ficou revolvendo areia para um lado e para outro, até que, desesperado não sabia mais onde estava seu aparelho. Todos então se prontificaram e começamos a revirar a areia ao redor dele até encontrar o aparelhinho de ouvido e devolver ao ouvido de onde nunca deveria ter saído.

O Sá Mourão, gozador como ninguém, quando estávamos no hotel, esperava o Calegari dormir para o acordar e dizer: Calegari, o Tadeu ou o Airton queriam te acordar e eu não deixei. O Calegari só ria. Estava feliz pela chance de estar longe de casa, desfrutando de companhia de amigos tanto gaúchos como baianos.

Na volta para casa, já escolado, entrou no clima e aproveitou para comer e beber tudo o que tinha direito no avião. Isso aconteceu em agosto de 1973.

De 1963 até 1973, o Calegari participou de campeonatos e torneios na AABB, no Vasco, no Noroeste, no Juventus e em todas as programações da Liga Caxiense. Foram os grandes anos de sua vida, ele que sempre teve problemas de saúde. Nesse período ele realmente viveu como todos nós e graças ao futebol de mesa, podemos afirmar que foram os melhores anos de sua vida.

Em 1973 foi meu último contato com ele. Vim para Santa Catarina e ele continuou em Caxias. Aos poucos o movimento foi enfraquecendo e sem a motivação que dávamos acabou parando de jogar. Soube que ele enfrentou problemas de sanidade dentro da agência do Banco, sendo então aposentado.

As últimas noticias que recebi dele foram através do Vanderlei Duarte que o encontra em suas caminhadas. Diz o Vanderlei que cumprimenta o Calegari e tem dias que ele responde, parecendo conhecê-lo, mas na maioria das vezes ele para e pergunta: Você me conhece? De Onde? Quem é você?

O tempo é nosso melhor professor, só que acaba exaurindo cada um de seus alunos. Com o Calegari não foi diferente, e agora com mais de oitenta anos, fica difícil recomeçar. Nas festividades dos 45 anos de fundação da AFM Caxias do Sul houve uma tentativa de levá-lo para que fosse homenageado, mas que resultaram infrutíferas. Ele acabaria não entendendo nada daquilo que estava acontecendo. Infelizmente todos nós rumamos para o mesmo final.

Calegari ficam conosco as melhores lembranças daquele amigão que tanto ajudou o futebol de mesa a atingir o patamar em que hoje se encontra. Não imaginávamos, naqueles anos distantes que tudo o que sonhávamos seria realizado por idealistas iguais a nós.

Que você consiga ter dias alegres e vivas com Deus no coração, apesar de tudo.

Com saudade de um tempo que não volta mais, até a semana que vem.

Sambaquy.



Um comentário:

  1. Prezado Sambaquy!

    É sempre muito prazeroso ler seus textos.
    Parabéns!

    Grande abraço do amigo

    Carlos Kuhn

    ResponderExcluir