segunda-feira, 8 de setembro de 2014

REGRAS GAÚCHA E BRASILEIRA SE AJUDARAM E CRESCERAM COM O TEMPO

Sei que muita gente vai refutar essa ideia, mas vou seguir adiante. A Federação Riograndense de Futebol de Mesa foi fundada em 1961 por Lenine Macedo de Souza. Logo após a consolidação dessa Federação, Lenine passou a um plano mais ousado e ajudou a fundar as Federações de São Paulo e Minas Gerais. No Rio Grande do Sul, onde foi criada a primeira federação da modalidade no país, Lenine comercializava o material que fabricava em sua empresa, próprio para a Regra Gaúcha. Vendia mesas, botões e bolinhas. E fazia isso com uma habilidade espantosa. Promovia, através da imprensa, as visitas que faria a determinada cidade, mostrando a beleza do futebol de mesa regulamentado. E, assim, ia vendendo os seus produtos, como o fez em Caxias do Sul, quando realizou uma demonstração no Recreio Guarany. Vendeu mesas, times e bolinhas para a Associação Atlética Banco do Brasil, Associação Banrisul e Recreio Guarany. Tudo fazia crer que, a partir dessa compra, teriam os caxienses direito a jogar os campeonatos promovidos pela Federação. Com o êxito dessas vendas que realizava, partiu para outros centros e ajudou, com o seu conhecimento, na criação de Federações. Fez isso com os paulistas e com os mineiros. Mas, apesar de toda a sua boa vontade, tendo inclusive organizado um campeonato brasileiro em Porto Alegre, em dezembro de 1962, conforme reportagem da Folha Esportiva, recebeu da Metalúrgica Abramo Eberle, de Caxias do Sul a premiação para o referido campeonato. Foram 20 taças e 20 medalhas que seriam disputadas em quatro categorias entre Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. O campeonato deveria ser realizado na Regra Gaúcha, o que não foi aceito pelos paulistas e mineiros, já que ambos jogavam com bolinhas redondas e em regras diferentes e, por essa razão, não compareceram. Acabou esse campeonato se transformando em um torneio entre gaúchos.
Em 1963, quando iniciei minha carreira no Banco do Brasil, tomei conhecimento da existência de um Departamento de Futebol de Mesa. Lá encontrei a mesa oficial da Regra Gaúcha, dois times de plástico, da marca Lione e várias bolinhas usadas nessa regra. Como eu já havia formado um time com botões de galalite, não me interessei pelos botões comprados pela AABB, os quais eram utilizados por quem não possuía time e desejava jogar. E assim, por dois anos ficamos realizando o nosso campeonato interno, da mesma forma que o Banrisul realizava os seus; o Sindicato dos Bancários promovia o campeonato bancário da cidade e, todos juntos, aproveitando a sede do Sindicato, realizávamos o campeonato caxiense. Mas, não éramos convidados para participar dos campeonatos estaduais, os quais tiveram o seu início naquele mesmo mês de dezembro de 1962, em substituição ao Campeonato Brasileiro. Em viagem a Porto Alegre, procurei o então presidente da Federação, Dr. Renato Ramos, o qual me orientou para que criássemos uma entidade que congregasse as agremiações da cidade. Foi então que fundamos a Liga Caxiense de Futebol de Mesa em 12 de junho de 1965.
Nosso primeiro campeonato, realizado em 1963, na Regra Gaúcha.
 Paulo Fabião
enfrentando Adauto Sambaquy. Árbitro Raymundo Vasques
O primeiro campeonato estadual a que participaríamos seria em dezembro de 1965. Partimos de Caxias, carregando o nosso campeão Deodatto Maggi e o nosso associado Sérgio Calegari. Iríamos conhecer outros botonistas. O campeonato, segundo a programação recebida, seria na sede do Clube Piratas. Rumamos para lá e tivemos a grande decepção de verificar o descaso da Federação, pois o campeonato estadual a que tanto ambicionávamos se resumiria em uma partida entre o campeão de Porto Alegre: Paulo Borges e o de Caxias: Deodatto Maggi. Sérgio Calegari foi o árbitro do jogo e eu o único assistente. Questionamos a ausência de outras cidades, mas não recebemos respostas convincentes. Paulo Borges sagrou-se campeão gaúcho de 1965 e Deodatto Maggi o vice. Não houve solenidade alguma, nem entrega de troféus, muito menos a presença de responsáveis pela Federação Riograndense de Futebol de Mesa.
No ano seguinte, ao comemorarmos o nosso primeiro aniversário, realizamos um torneio em nossa cidade que acabou tornando-se um Torneio Interestadual. Contamos com a participação de botonistas de Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas, Caxias do Sul e, especialmente, os convidados Oldemar Seixas e Ademar Carvalho, baianos de Salvador. Desfilaram nas mesas Paulo Borges (campeão gaúcho), Clair Marques (campeão de Rio Grande), Gilberto Ghizi (Presidente da Federação Riograndense), Vicente Sacco Netto (representando Pelotas), Claudio Saraiva, Sergio Duro e Cláudio Bittencourt (todos de Porto Alegre) e os caxienses Deodato Maggi, Marcos Lisboa, Vanderlei Duarte, Carlos Valiatti, Paulo Valiatti, Raymundo Vasques, Sérgio Calegari, Sérgio Silva e Adauto Celso Sambaquy. Após a entrega dos troféus do Torneio, os dois baianos realizaram, em uma mesa especialmente construída para a ocasião, a partida que mudou os destinos da unanimidade da Regra Gaúcha em território sulista. Gilberto Ghizi se apaixonou pela maneira eficiente demonstrada pelos baianos, no que foi acompanhado por todos os presentes. O sucesso desse torneio fez com que Gilberto solicitasse que a Liga Caxiense fosse a promotora do campeonato estadual de 1966. Isso nos aproximou bastante da direção da Federação e, juntos, realizamos um anteprojeto, mesclando as Regras Gaúcha e Baiana em suas partes boas, extirpando aquilo que julgávamos absurdo em ambas. No mesmo tempo em que trabalhávamos nesse anteprojeto, propusemos que o campeonato estadual que realizaríamos seria em três categorias: infantil, juvenil e adulto, o que foi aceito pelo Gilberto Ghizi. Em 17 e 18 de dezembro, no Colégio Nossa Senhora do Carmo, conseguimos reunir as cidades de Porto Alegre, Rio Grande, Arroio Grande, São Leopoldo, Rosário do Sul e Caxias do Sul. Na categoria adulta, o campeão foi Carlos Saraiva (Porto Alegre), vice: Fausto Borges (São Leopoldo), 3º Paulo Valiatti (Caxias do Sul); quarto Clair Marques (Rio Grande). Na categoria juvenil, o grande campeão foi Gerson Garcia (Rio Grande), ficando Mauro Borges (Rosário do Sul) em segundo; Airton Dalla Rosa (Caxias do Sul) o terceiro e Luiz Elodi (Porto Alegre) quarto colocado. Na categoria infantil, o campeão foi José Roberto Sobreiro (Porto Alegre) Almir Manfredini (Caxias do Sul) o seu vice-campeão.
No ano seguinte, poucos dias após esse campeonato, a Regra Brasileira foi aprovada em Salvador.  Apesar de haver sido discutida no campeonato estadual, apresentada que fora pelo Gilberto Ghizi e aprovada por todos os presentes, a resistência à mudança foi incrível. Os dois gaúchos que participaram de sua confecção foram taxados de traidores e houve um golpe de estado na Federação, quando Lenine, que estava afastado, retorna e destitui Gilberto Ghizi da presidência. Declarada guerra à Regra Brasileira que, entretanto fora aceita em Caxias do Sul e dali para todo estado, através de um trabalho minucioso de demonstração, exibição, torneios e muitas viagens. Isso fez com que a Federação Riograndense se motivasse e marcasse para Rio Grande o próximo campeonato estadual. Clair Marques ficou encarregado de arrumar o local e no dia aprazado, com queima de fogos de artifício, vários carros fizeram uma passeata pela cidade, promovendo o futebol de mesa na Regra Gaúcha. Só que havia modificações na regra, impostas pelo lado comercial do Lenine. Em cada competição promovida pela Federação, o botonista deveria retirar de seu time cinco botões, substituindo-os por cinco botões da fabricação Lione. Isso não foi aceito pela grande maioria dos botonistas da Regra Gaúcha, pois formavam seus times com muito cuidado e atenção. Escolher cinco e substituí-los de última hora foi um tiro n´água. Mas, o perigo maior que os praticantes da Regra Gaúcha enxergavam era o crescimento da Regra Brasileira no estado. Por essa razão, a partir de então realizaram mais competições, procurando mostrar a força do futebol de mesa pioneiro no estado. Realizaram campeonatos estaduais em diversas cidades, difundindo a Regra Gaúcha.
O primeiro campeonato estadual realizado na Regra Brasileira no estado foi em 1973. A cidade de Canguçú, com a chegada de Vicente Sacco Netto, resolveu sediar a competição, inédita até então. Foi um sucesso absoluto. Na ocasião, por proposição nossa, foi criada a União de Ligas de Futebol de Mesa da Regra Brasileira no Estado do Rio Grande do Sul. Ela se tornaria o embrião da atual Federação Gaúcha de Futebol de Mesa. O detalhe é que não queríamos, de maneira alguma, interferir com a Federação Riograndense já existente. Ela seria a primeira e nós seríamos uma entidade que reuniria apenas os simpatizantes da Regra Brasileira.
O tempo passou e a Federação Riograndense fechou suas portas. Foi então que o grupo que geria a União de Ligas adonou-se da sigla e criou, mudando o nome para Federação Gaúcha de Futebol de Mesa.
Flâmula do Estadual de Canguçu - 1973
1º Estadual de Canguçu (Regra Brasileira) -1973
2º Estadual em Jaguarão (Regra Brasileira) -1974
A pergunta que deve ter ficado no ar: As duas regras se ajudaram? Eu acredito que sim, pois foi de nossa parte uma luta limpa e justa. Nunca atacamos a Regra Gaúcha, que foi onde iniciamos. Nós sempre primamos pela grandeza do futebol de mesa, nunca tivemos interesse comercial para defender. A luta, entretanto, fez com que a Regra Gaúcha crescesse bem mais do que antes e se tornasse uma regra com grandes botonistas, evitando perder espaço para a Regra Brasileira. Ao mesmo tempo, nós estávamos fazendo o nosso trabalho e vendo a aceitação se espalhar pelos diversos recantos do estado, com a grata recompensa de mantermos, com botonistas de outros estados, um intercâmbio valioso.
Hoje, depois de tantos anos passados, vejo com alegria a participação de botonistas em ambas as Regras e trocando mensagens amistosas, como sempre foi sonhado por nós. O futebol de mesa é algo maravilhoso e deve ser compartilhado com fervor e amizade por todos os botonistas. Tenho amigos maravilhosos na Regra Gaúcha e sempre que puder ajudá-los o farei com maior carinho e dedicação. 
Confraria dos Lobos 2ª Copa  na Regra Gaúcha
FOSCA um grande praticante das duas regras (Brasileira e Gaúcha)
Da mesma forma vejo as demais Regras, que proliferam em nosso país continental, ganhando forças e realizando competições maravilhosas em suas regiões. Futebol de mesa é algo que deve ser encarado com amor e carinho, não importando a maneira pela qual seja praticado, pois a ideia é sempre a mesma: desfrutar da amizade da pessoa que está do outro lado da mesa, pois ela é adversária naquele momento e, nunca, inimigo.
Miguel Oliveira joga nas duas regras, sendo campeão brasileiro e campeão gaúcho
Regra Gaúcha em 2011
Até semana que vem, se Deus assim permitir.

2 comentários:

  1. É isso aí, amigão Sambaquy. Fico a imaginar todo esse trabalho para difundir a regra brasileira. Quando se fala em mudanças, haverá sempre reações contrárias. Isso sempre foi assim e não vai mudar nunca. O tempo é que se encarrega de aparar as arestas. Aqui, tentamos não unificar as regras, mas colocá-las sob um mesmo teto. Fundamos a APFM, eclética, com espaços para campos de várias regras. De início, a regra paulista dividiu com o botãobol, mas durou pouco tempo. Não houve empatia entre os botonistas. O pessoal da brasileira esteve em visita, porém, não achou interessante a idéia. Em suma: cada macaco no seu galho. Talvez, seja essa a principal razão do futebol de mesa pernambucano ser tão díspare. Há de fato, muitos praticantes, nos diversos bairros, cada qual com sua modalidade. Em rápida pesquisa, observou-se que a regra leva-leva é a que tem mais adeptos, sendo praticada pela meninada, nos condomínios e nas calçadas, em forma de brincadeira de criança. Para eles, nós adultos, praticantes das outras regras, somos tido como profissionais. E, asim, a vida continua, cada um na sua... Um forte abração pernambucano e siga sempre escrevendo as memórias do futebol de botão aí no seu Rio Grande.

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    1. Amigo Abiud, nada é fácil nessa vida. No principio houve uma campanha contra nós por estarmos jogando a Regra Brasileira. O jornal A Folha da Tarde Esportiva chegou a publicar uma noticia com o título: Estourou uma guerra de botões entre Porto Alegre e Caxias. Mas, aguentamos no osso do peito e levamos adiante. Era algo que havíamos sonhado e tinha de dar certo, como de fato deu. Quanto a duas ou mais modalidades num mesmo teto, acho que divide muito. Aqui em Itajaí havia um núcleo da 12 toques e começaram a jogar dadinho. Repartiu e acabou ficando dois grupos sem força alguma. Para confessar, faz um ano e dois meses que eu não vou lá. Ia sempre com um amigo engenheiro que jogava a 12 toques, mas como ele desistiu, não foi mais e também fiquei na minha. Já estava jogando uma regra que não era a minha original e ainda assim ter de estar tentando arrumar a casa, não dá. O pessoal começa a todo vapor e depois vai arrefecendo aos poucos até parar. O presidente se desentendeu com alguns botonistas e agora joga pela Federação Paranaense. Ai perde a graça pois a gente vai e vê pessoas com mágoas. Não dá certo.
      Um abração gaúcho de quatro costados.

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