segunda-feira, 15 de novembro de 2010

...E OS BAIANOS JOGAVAM COM A UNHA...


Uma das coisas que mais nos impressionaram, quando recebemos a visita dos baianos Oldemar D. Seixas e Ademar Dias de Carvalho foi o fato de eles não utilizarem fichas, palhetas ou as réguas atuais. Eles impulsionavam os botões com suas unhas do dedo indicador. E o faziam com uma precisão matemática que mostrava a beleza de jogadas feitas com precisão.

Na minha primeira incursão à Bahia, fiquei impressionado com a quantidade de praticantes que agiam da mesma maneira. Joguei em Salvador, Mataripe e Santo Amaro com grandes botonistas, os quais ficaram gravados em minha história: Jomar Maia, Roberto Dartanhã, Geraldo Lemus, Norival Factum, Fernando Contreiras, Armando Passos, Mariano Salmeron Neto, Amauri Alves, Álvaro Cesar, Cesar Costa ( que jogava sempre com um charutinho na boca), Dr. Elias Morgado, Luiz Raimundo, Marcio Gomes, Geraldo Holtz, Carlos Alberto Magalhães, José Mascarenhas, Milton Silva, Webber Seixas, Nelson Carvalho, Oldemar e Ademar, todos impulsionando seus craques com a unha, sempre com a mesma precisão.

Eu havia recebido o primeiro time de botões baianos que aportou o Rio Grande do Sul. Uma seleção brasileira, que apelidei imediatamente como a seleção de 1958, embora eu, nem de longe pudesse ser comparado ao Vicente Feola, que nos deu o primeiro título mundial. Esses botões fazem parte de meu acervo e estão comigo há mais de quarenta e quatro anos. E neles está o segredo de poder jogar com a unha. Eu mesmo consegui realizar algumas partidas jogando com a unha, e fazendo até gols bonitos. Mas, o desgaste sempre foi marcante, e as unhas acabam por se romper, pelo esforço continuado. Era preferível jogar com a palhetas.

O mago dos botões, o meu amigo José Aurélio, que morava à rua J.E.Lisboa, antiga e atual Estrada da Rainha, pois o nome não consegui se firmar,(visto que todos conheciam aquela tradicional rua de Salvador como Estrada da Rainha), conseguia fazer com que fosse possível jogar com a unha. E o segredo dessa confecção era guardado a sete chaves. Jamais ele deixou que víssemos trabalhando em seus botões. Mostrava tudo, menos a fabricação. Lembro ainda de um time que ele havia fabricado para uma encomenda, com os distintivos do Real Madrid embutidos. Um time lindo e cheio de detalhes que, para nós era uma tremenda novidade.

O segredo disso tudo estava no grau da quina dos botões. Os botões para jogar com a unha tinham uma quina arredondada o que facilitava a impulsão dos botões. Nós, gaúchos, usávamos uma quina viva, que permitia que a palheta determinasse a direção do botão em direção à bolinha. O Zé Aurélio, diante de nossas necessidades, teve de adaptar sua fabricação ao gosto dos gaúchos, pois, após a implantação no Rio Grande do Sul, as encomendas aumentaram consideravelmente.

A nossa adaptação demorou mais tempo em virtude das espécies dos botões que os baianos trouxeram em sua bagagem, e, venderam todos no Rio Grande do Sul. Todos foram confeccionados para serem impulsionados com a unha. Quando nós, gaúchos, apoiávamos a palheta em cima do botão, o deslize era imediato devido a inclinação da quina dos botões. E isso prejudicava o nosso desempenho. Custamos algum tempo a nos aperceber dessa artimanha própria dos baianos. O primeiro a descobrir essa diferença foi o Vicente Sacco Netto, que solicitou um São Paulo, com dimensões diferenciadas e com a rebarba mais pronunciada, sem a ondulação baiana . Logo em seguida o Raimundo Antonio Rotta Vasquez solicitou um Vitoriense, idêntico ao do Vicente. A partir daí mudou o sistema de solicitações de botões e o Zé Aurélio passou a fabricar botões especiais aos gaúchos.

Mesmo assim, quando fomos participar do primeiro brasileiro, deve-se ressaltar que os botões ainda eram influenciados pela fabricação baiana, com ângulos adaptados para serem impulsionados com a unha.

Nós ainda tínhamos muito a aprender, e, com certeza, aprendemos com o passar dos anos.

Na época, haviam apenas dois fabricantes de botões de acrílico e um de palaton. Os de acrílico eram o José Aurélio e José Castro Sturaro, e, o de palaton o Milton Silva, o grande botonista Miltinho.

Pagamos o preço do aprendizado. Afinal nós é quem estávamos mudando o nosso sistema tradicional de botões puxadores, fabricados na rua Paulino Teixeira, 51, em Porto Alegre para os botões padronizados, fabricados por baianos e que vinham para nós através da VARIG. Estávamos avançando na escala botonística brasileira e deveríamos pagar o alto preço de sofrer, até podermos abiscoitar os grandes prêmios. Era questão de tempo. E o tempo passou e hoje estamos no mesmo patamar, com um detalhe, os baianos passaram a usar palhetas e réguas para jogarem. Os antigos praticantes da unha estão rareando e desaparecendo. Já não se vê Oldemar Seixas, Webber, Ademar, Miltinho, Jomar Maia, Cesar Zama, José Ataide, Dr. Gantois, Orlando Nunes, Vital Albuquerque, Dr. Valter Motta, Geraldo Holtz, Guilherme José, Luiz Alberto Magalhães (um técnico notável que jogava futebol de mesa com a maestria do xadrez), Roberto Dartanhã, José Santoro Bouças,o Pépe, Dr. Jaime, Ubaldo e tantos outros que encontramos na terra linda da Bahia.

Mas, o que foi mais importante em tudo isso foi a união que aconteceu, pois hoje nos encontramos em qualquer parte do país e podemos nos abraçar com saudade, pois nossos encontros já se realizaram em outros pontos do país, e, por isso, somos velhos amigos, adversários nas mesas, mas amigos do coração.

Que o diga o meu irmão Oldemar Seixas, que da distante Salvador conversa comigo muitas vezes por mês, via telefone. Há quase cinqüenta anos jamais imaginaríamos que isso pudesse acontecer. Só que o futebol de mesa consegue fazer esse milagre. Amigos são verdadeiramente o nosso maior troféu. São guardados em uma galeria especial que está em nosso coração.

Até a semana que vem, se Deus permitir.

Sambaquy.

Um comentário:

  1. Ola gran mestre...

    Esses dias durante uma da aulinhas que ministro estava sempalheta e utilizei a unha par amostras, e não é que a jogada sai legal rsrs...

    abraços, fique com Deus

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